Não tem como negar que as regras de publicidade médica do Conselho Federal de Medicina são essenciais para regulamentar a profissão. São elas que garantem a ética entre os profissionais e fazem com que sejam resguardados os direitos do médico e do paciente.
Ainda assim, a discussão levantada nos últimos anos entre médicos de diversas especialidades é se elas estão adequadas aos dias de hoje, especialmente quando falamos de marketing digital.
Desde a publicação do Manual de Publicidade Médica (Resolução 1.974/11), a internet evoluiu e transformou a maneira como vivemos. Entre as principais mudanças, chamamos atenção à popularização das redes sociais, à forma como nos relacionamos e que acessamos informações. Nunca o conhecimento esteve tão acessível.
No entanto, as regras de publicidade médica sofreram poucas modificações para acompanhar essa transformação. Isso contraria o que o próprio manual afirma quando diz que “como várias outras regras, esta também deverá ser revisada periodicamente para se manter passo a passo com a evolução da moral contemporânea (hábitos e costumes)”.
Esse movimento já foi adotado, inclusive, pelos códigos de ética de outras profissões. A exemplo da Odontologia, a atualização acaba por impactar diretamente algumas áreas da Medicina, como a Dermatologia, com a liberação do “antes e depois” de procedimentos estéticos faciais.
Enquanto o Manual de Publicidade Médica não é atualizado, as orientações mais urgentes sobre o tema foram lançadas a partir de notas técnicas e pareceres do CFM. No entanto, os profissionais ainda percebem alguns pontos que precisam ser revisados e atualizados.
Neste texto, selecionamos os 4 principais tópicos de discussão entre os médicos. Confira a seguir.
Diferenças das regras de publicidade médica para a resolução do CFO
A Odontologia foi uma das profissões beneficiadas pela atualização do seu código de ética e das regras de publicidade.
Em 2019, o Conselho Federal de Odontologia publicou a resolução CFO-196/2019, com algumas alterações importantes que flexibilizaram a divulgação profissional.
A principal delas permitiu a publicação de imagens dos pacientes, mediante a sua autorização pela assinatura de um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), incluindo comparações de “antes e depois” dos procedimentos realizados.
A regra, que proibia as fotos comparativas, ainda é vigente para médicos. Seu fundamento está centrado em alguns objetivos essenciais: evitar a concorrência desleal e, principalmente, evitar a promessa de resultado. Afinal, a prática pode terminar em um processo contra o médico, com o paciente requerendo um resultado igual ao da foto publicada.
No entanto, o problema ganha novo olhar quando um ou mais procedimentos podem ser realizados por profissionais de diferentes áreas – e apenas uma delas pode divulgar.
A reivindicação dos médicos, nesse caso, é que a proibição de um e liberação de outro causaria uma concorrência desleal, já que o paciente consegue ver o “resultado” dos procedimentos feitos apenas pelos cirurgiões dentistas.
Na prática, a questão passa a exigir não somente uma nova análise e atualização das regras da publicidade médica, mas também do nosso sistema legal como um todo. O entendimento dos profissionais da Medicina, do Conselho Federal, dos pacientes e de quem julga um eventual processo tem que estar alinhado. Fácil não é, mas também não é impossível.
Vídeos no TikTok e Reels
O segundo ponto é relacionado a uma das principais mudanças das redes sociais nos últimos anos: a preferência por vídeos curtos e dinâmicos.
A ascensão do TikTok revolucionou a maneira como criamos conteúdo e influenciou as últimas atualizações de apps famosos. Um exemplo é o Instagram, com a inclusão do Reels e de um algoritmo que impulsiona o alcance do conteúdo publicado nessa ferramenta.
A dúvida que fica para os profissionais da Medicina é até onde podem ir.
É claro que o respeito às regras de publicidade médica já determinadas, como a não exposição do paciente, se estende para esse novo formato. Mas outras novidades não estão tão claras.
Entre as categorias de vídeos mais famosas do TikTok estão as danças, as dublagens e os vídeos que apelam para o estranho ou inusitado para chamar atenção.
Essa última costuma ser utilizada por parte dos profissionais quando mostram feridas abertas, grandes cicatrizes, entre outras. O objetivo dessa “estratégia” é chamar atenção de quem está assistindo. A justificativa é de que seria um vídeo de conscientização, ou mesmo para normalizar essa que é só mais uma parte do seu dia a dia.
Nenhum desses tipos de conteúdo é visto com bons olhos pela CODAME (Comissão de Divulgação de Assuntos Médicos). Na visão da comissão, é preciso evitar o sensacionalismo e as “situações indecorosas” no perfil profissional, por exemplo, as danças ou simulações.
É preciso pensar na credibilidade que o profissional passa para seus pacientes – e isso em tudo o que estiver envolvido, inclusive nas redes sociais.
Recentemente, tivemos um caso de suspensão do registro profissional de uma cirurgiã plástica de Ribeirão Preto. A médica aparecia em diversos vídeos exibindo pele e gordura humanas após suas cirurgias, enquanto dançava, sorria e fazia coreografias.
Casos como este são exemplos extremos, mas servem para nos lembrar que existem limites. Não vale a pena recorrer a tudo para ganhar exposição. É bom ter sempre em mente que a imagem profissional e a credibilidade estão constantemente em jogo.
Profissionais da saúde podem utilizar o Reels e o Tik Tok desde que os vídeos sejam feitos com informações de cunho educativo, com bom senso e integridade. Falamos mais sobre o que o médico pode publicar nessas ferramentas neste artigo do blog.
Nesta questão, reforça-se a necessidade de revisão e atualização das regras da publicidade médica pelo Conselho Federal de Medicina. Não se trata apenas de “liberar” mais formatos, conteúdos ou canais de divulgação, mas de esclarecer também, detalhar mais o que é permitido e o que não deve ser feito.
Afinal, determinadas publicações não favorecem nem o médico, nem os pacientes – e, ainda assim, aparecem com frequência nas redes sociais.
A criação de infoprodutos
Outra categoria em ascensão nas redes sociais é a comercialização dos infoprodutos, conteúdos em formato digital que podem ser distribuídos na internet. É o caso de e-books e cursos digitais.
Atualmente, é permitido criar e-books de distribuição gratuita, bem como vídeos de cunho educativo. No entanto, as regras ainda não mencionam uma possível venda desses “produtos”, como ocorre com livros físicos.
Além disso, o Manual de Publicidade Médica deixa claro que as informações fornecidas pelo profissional não podem:
- substituir a consulta individual
- ser caracterizadas como mercantilização da Medicina
- ter como propósito a autopromoção do profissional.
Assim, diante de um cenário de crescimento massivo de infoprodutos, de uma sociedade com pouco acesso à saúde e orientações sobre prevenção, é preciso revisar e considerar a flexibilização de alguns pontos.
Não se propõe a liberação de venda de materiais ou cursos sem critério, mas de analisar as possibilidades e deixar claro o que pode ser feito, mantendo a credibilidade da Medicina e favorecendo os pacientes.
Grupos nos aplicativos de mensagem
Por último, precisamos mencionar uma forma de distribuição de conteúdo que remete ao e-mail marketing, mas tem uma característica muito mais interativa: os grupos no Facebook, Telegram, Whatsapp ou Instagram.
Esses grupos costumam ser abertos, o que significa que qualquer pessoa na internet pode entrar. Porém, em alguns casos, podem ser fechados e direcionados apenas a pessoas que compraram determinado infoproduto – como um curso, por exemplo.
Os grupos podem ser uma forma de divulgar informações relacionadas à especialidade do profissional diretamente na caixa de entrada ou feed daqueles que já demonstraram interesse pelo conteúdo (ao entrar no grupo). Daí vem a comparação com o e-mail marketing.
Vários profissionais da saúde, como nutricionistas e muitos outros, têm utilizado essas plataformas como meio de disseminar conteúdos sobre temas específicos, como o emagrecimento, por exemplo.
Na internet, vemos ainda muitas outras abordagens, tanto da Medicina quanto de diversas áreas da saúde. Há profissionais monetizando, inclusive, os “melhores amigos” do Instagram. Quem paga tem acesso às publicações direcionadas a esse grupo restrito. Uma abordagem já bem diferente do que a disseminação de conteúdo com caráter apenas educativo.
Fornecer informações, auxiliar na educação e orientação da comunidade como um todo é algo capaz de ajudar milhares de pessoas. Não se trata de realizar diagnósticos ou substituir consultas, mas de orientar acerca de atitudes preventivas gerais e, até mesmo, sobre estar atento a determinadas condições de saúde.
Quanto à monetização, vamos entrar na mesma questão que falamos no tópico anterior. O médico não pode ser remunerado por fornecer esclarecimentos gerais à comunidade? Por sanar dúvidas comuns?
Ainda não há um posicionamento do Conselho sobre a participação do médico em grupos de redes sociais. No entanto, o parecer CFM nº 14/2017 afirma, sobre o WhatsApp, que “é permitido o uso do Whatsapp e plataformas similares para comunicação entre médicos e seus pacientes, bem como entre médicos e médicos”.
Isso, é claro, respeitando alguns critérios, como não substituir a consulta, não envolver imagens identificáveis de pacientes, assustadoras ou enganosas.
Ainda assim, há uma extensa lacuna em relação à posição do Conselho sobre as novas mídias e os diferentes recursos disponíveis e amplamente utilizados por toda a sociedade hoje em dia. Novamente, é urgente a necessidade de análise e posicionamento diante do cenário atual.
Indícios de mudanças
O Conselho Federal de Medicina tem sinalizado, nos últimos anos, a possibilidade de mudanças nas regras de publicidade médica. No ano passado, de fevereiro a março/2020, o CFM abriu uma consulta pública sobre o Manual de Publicidade Médica, para ouvir a opinião dos profissionais, sugerindo acréscimos, supressões e outros ajustes.
Além disso, em abril deste ano (2021), o CODAME organizou uma série de 4 webinars para debater mudanças nas regras de publicidade médica. O evento foi direcionado apenas aos conselheiros federais e regionais de medicina e membros das comissões de divulgação de assuntos médicos, mas já é um sinal de que o CFM está aberto ao debate.
Será que vem mudança por aí?
Por enquanto, ficamos no aguardo.
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